Das diversas lembranças que carrego da minha infância, lembro-me fortemente da minha avó - por parte de mãe -, em sua velha máquina de costura com muitos retalhos espalhados pelo quarto: no chão, na cama, numa mesinha pequena, que parecia uma tábua de passar roupa. Entre almofadas e carretéis de linha, em uma diversidade de tecidos, dos quais não se podiam contar, a única coisa que eu tinha certeza é que desses muitos tecidos, a maioria deles eram retalhos, como já havia falado antes, que se tornavam empecilhos para entrar no quarto que era o mesmo local de dormir e trabalhar. Certamente, não pensei em nada naquele momento, a infância é apenas brincadeira. Todavia, por algum motivo, essa lembrança me persegue, e possuo uma memória que não me deixa falhar, em quase nada. Voltando aos retalhos que minha avó costurava, das poucas vezes que consegui adentrar aquele quarto, percebi que os retalhos estavam sendo cortados em quadrados iguais e ganhavam uma forma bonita quando costurados juntos, um ao lado do outro numa medida em centímetros que desconheço, até hoje. Eu sempre voltava para casa no fim das tardes de domingo quando costumávamos ir “passar o dia” com a família, e por esse motivo, nunca via o fim que os retalhos costurados levavam. Até que, um dia, quando fugimos à regra daquela velha rotina, fomos à casa da minha avó, e observei retalhos por sobre a cama, retalhos grudados, e agora, com uma “cara” de colcha, na verdade, era isso. Aquele “monte” de retalhos espalhados pelo chão e por todo canto que minha visão pôde alcançar, agora tinha uma finalidade: enfeitar; e mais, cobria, esquentava e era uma peça de guarda-roupas tanto quanto as outras que compramos em alguma loja de cama, mesa e banho. Só que essa colcha foi costurada pela própria pessoa que a utilizaria, logo após o seu término, isso era bem óbvio. E é aí, que me permiti refletir: retalhos diversos, de estampas desiguais e texturas incomuns; juntos podem ter utilidade, podem ter algum fim.
Quem nunca se notou separado? Quem bem se percebe, percebe também o que não há em você de você mesmo. Eu mesma poderia ser um desses retalhos, separada em várias partes de mim por pessoas que julgavam melhor separá-los. Há uma frase bem conhecida que diz que "por onde passamos deixamos sempre um pouco de nós"... Em um dado momento da vida, essa é a realidade de todos nós. O problema é como recuperar as partes já espalhadas, se é que isso é possível. Considerando a impossibilidade, de recuperá-los; o jeito é refazer-se de retalhos novos, com novas estampas, para então, costurar-nos novamente. Sentir-se novo é outra história.
Por Evilin Melo
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